Exposição de motivos
A evolução da distribuição da riqueza em Portugal continua a ser demonstrativa de uma profunda injustiça social. As assimetrias existentes na acumulação de riqueza não só não se esbatem, como confirmam que uma pequena percentagem das famílias portuguesas detém mais de metade da riqueza, enquanto a esmagadora maioria dos portugueses ficam com uma pequena fatia dessa riqueza.
O Inquérito à Situação Financeira das Famílias de 2020, realizado entre outubro de 2020 e fevereiro de 2021, considerou os dados relativos à situação epidémica vivida, tendo concluído que o seu impacto na situação financeira e no rendimento das famílias foi maior nas famílias que dependiam do rendimento do trabalho do que no período anterior a esta.
O Inquérito às Condições de Vida e Rendimento, realizado em 2020 pelo INE sobre rendimentos do ano anterior, indica que 16,2% das pessoas estavam em risco de pobreza em 2019.
A taxa de risco de pobreza correspondia, em 2019, à proporção de trabalhadores com rendimentos líquidos inferiores a 6 480 euros anuais, ou seja, 540 euros por mês (com Salário Mínimo Nacional de 600 euros). Quer isto dizer que o seu rendimento mensal não é suficiente para as despesas básicas familiares, sendo inegável que os baixos salários e em particular o valor do Salário Mínimo Nacional (SMN) constitui uma das principais causas de pobreza.
Estes dados demonstram a injustiça na distribuição da riqueza e o processo de concentração da riqueza promovida por sucessivos Governos, e evidenciam as consequências desastrosas de décadas da política de direita, em particular no emprego, na produção nacional, nos serviços públicos e nas funções sociais do Estado, na dependência externa e nas limitações à soberania nacional.
Para inverter este processo de injustiça, pobreza e agravamento da exploração é determinante valorizar o SMN. Ao longo dos anos, o SMN tem sido profundamente desvalorizado por sucessivos governos, com atualizações abaixo do aumento dos rendimentos médios e do índice de preços ao consumidor. Bastaria que tivesse acompanhado a evolução deste último critério para que tivesse atingido em 2005 os 500 euros. Aliás, se o SMN tivesse sido atualizado todos os anos, considerando a inflação e o aumento da produtividade, o seu valor seria hoje muito superior.
Em janeiro de 2021 o SMN foi fixado em 665 euros, e só em Janeiro de 2022 foi fixado em 705 euros, aumento esse que sendo claramente insuficiente para a reposição do poder de compra e para enfrentar o custo de vida é inseparável da luta dos trabalhadores que o PCP valoriza.
Impõe-se por isso a necessidade de avançar para um aumento geral dos salários, incluindo o Salário Mínimo Nacional para 850 euros.
Em Portugal, o SMN é a remuneração de referência para centenas de milhares de trabalhadores. Segundo os dados do Boletim Estatístico de Janeiro de 2022 1, no segundo trimestre, a população com emprego correspondia a 4.878.100 trabalhadores, sendo que, consultando este mesmo documento, os seus dados indicam que, em Abril de 2019, 25,6% auferiam o salário mínimo nacional, o que correspondia a mais de 1 milhão e 200 mil trabalhadores.
Esta realidade prova que os baixos salários continuam a ser uma opção política e uma realidade predominante no país, configurando uma das causas das enormes e gritantes desigualdades sociais.
É uma emergência nacional o aumento geral dos salários e, em particular o Salário Mínimo Nacional, para fazer crescer a economia e o emprego, para aumentar as contribuições para a Segurança Social, para aumentar o poder de compra perdido e agravado pela inflação que provoca uma subida acentuada dos preços, sobretudo dos bens de consumo, para assegurar o regresso de tantos jovens forçados a emigrar pelo agravamento das condições de vida e pela política de direita do Governo PSD-CDS.
É uma emergência nacional o aumento geral dos salários e, particularmente o Salário Mínimo Nacional, para assegurar o direito aos jovens a ter filhos, a constituir família, para assegurar mais justiça na distribuição dos rendimentos.
Os argumentos invocados para não aumentar o salário mínimo nacional prendem-se com a falsa ideia do peso das remunerações na estrutura de custos das empresas e no seu suposto efeito negativo para a competitividade. Na verdade, as remunerações têm um peso muito inferior a um conjunto de outros custos, designadamente com a energia, combustíveis, crédito ou seguros. Convém, aliás, referir que este conjunto de custos estão sujeitos à estratégia de lucro máximo de um conjunto de empresas e sectores que, depois de privatizadas passaram a penalizar fortemente a economia nacional.
A criação e consagração do direito a um salário mínimo nacional foi uma das importantes conquistas da Revolução de Abril e do regime democrático. À data, representou uma melhoria muito expressiva nas condições vida dos trabalhadores, no entanto, não acompanhou o aumento do custo de vida e tem sido ao longo das décadas profundamente desvalorizado com atualizações abaixo do aumento dos rendimentos médios e do índice de preços ao consumidor, e viu até o seu valor congelado entre 2011 e 2014.
Não se combate a pobreza, incluindo a pobreza infantil, sem assumir a necessária valorização dos salários e o aumento do salário mínimo nacional de forma significativa.
Não se pode ter pensões mais elevadas no futuro sem aumentar os salários no presente, nomeadamente o salário mínimo nacional.
Não se dinamiza a economia sem assumir que são os salários dos trabalhadores que influenciam o consumo, a procura e a dinamização do mercado interno.
Não se defende a emancipação dos jovens sem assumir que, para que estes possam sair de casa dos pais e concretizar projetos de vida, é fundamental que tenham vínculos estáveis e salários que lhes garantam condições para construir, de forma autónoma, o seu caminho.
Não se combate a emigração de trabalhadores qualificados nem se fixam trabalhadores na Administração Pública sem valorizar os salários, as carreiras e as profissões.
Não se pode falar de sustentabilidade da Segurança Social sem assumir que o aumento dos salários é determinante para esse objetivo.
Não há país desenvolvido sem trabalhadores valorizados. Para o PCP o aumento do salário mínimo nacional é imperioso, por razões de justiça social e de uma mais justa distribuição da riqueza, mas também por razões de carácter económico, uma vez que assume especial importância no aumento do poder de compra, na dinamização da economia e do mercado interno.
O PCP tem-se batido pelo aumento do Salário Mínimo Nacional para 850 euros e reapresenta agora essa proposta, sem prejuízo de durante o ano de 2022 se fixar um valor de 800 euros, tal como foi já anteriormente admitido.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte
Resolução
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição recomendar ao Governo que aumente o salário mínimo nacional para os 850 euros.
(1) Boletim Estatístico do Gabinete de Estratégia e Planeamento – Ministério do Trabalho Solidariedade e Segurança Social, janeiro de 2022, páginas 7 e 14↲